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Maricá - Itaipuaçu, Rio de Janeiro, Brazil
Sou poetisa, cantora, compositora e amante das artes.

domingo, 4 de outubro de 2009

BETÂNIA - Arthur Veronezzi




Eu sempre fui tarado numa bunda.

Podia ser qualquer uma: grande e arredondada, tipo pandeiro, pequena e meio murchinha, feito pudim de pão, daquelas gordas e rechonchudas que parece que vão te abraçar, das magras, sem muito recheio, daquelas arrebitadas, cujo olho do cú tem vontade de ver o céu, ou das caídas, que teimam em mirar o chão, daquelas que apontam pra trás, te mostrando a direção certa, ou daquelas que se espalham pros lados, assim como que querendo tomar conta do recinto. Também podem ser durinhas e firmes, feito bola de futebol, daquelas que a gente teima em amassar, mas não consegue e podem até ser molinhas, feito gelatina, daquelas boas de se deitar em cima. Celulite? Não sei do que se trata. Eu como pêssego e laranja.

Eu nunca liguei muito pro conjunto. Uma mulher, pra mim, sempre se resumiu a uma bunda. Não, não pense que eu sou machista. Todas as minhas namoradas são extremamente inteligentes, mas são bundas inteligentes. Eu não consigo me desvencilhar dessa coisa. Não conseguia. Até quando eu os vi.

Veja bem, eu estava na minha, sentado na areia de Camboinhas, viajando na beleza do mar, quando resolvi me esticar pra pegar um sol. Ao me deitar, pude ver, na altura do rosto, uma coisa linda. Uma coisa cheia de curvas perfeitas e anatômicas, desenhadas pra minha boca. Uma coisa branquinha e macia, com cinco apêndices homogêneos, levemente aninhados na areia.

Fixando os olhos, pude ver que não era uma, mas duas coisas lindas. Eu não sei o que me deu. Eu, simplesmente, me virei e disse, quase abocanhando: “que pezinho mais lindo”. A dona, naturalmente assustada, puxou-os pra debaixo da cadeira, onde eu quase não os podia ver. Tive, então, que olhar pra ela. Nada ruim. Meio branquela demais pro meu gosto, mas até que tinha um rosto bonitinho. A bunda. “Eu preciso ver a bunda dela”, eu pensei. Mas ela não se levantou. Só fixou o olhar reprovador no meu olhar.

_ Desculpe-me. Estou apaixonado pelos seus pés. Eu nunca vi pés tão perfeitos...

_ Você é maluco, é?

_ Não. Eu... Eu... Eu sou designer de sandálias. – Meti essa lorota, sem a menor vergonha na cara. Cara, você não está entendendo, eu precisava tocar naqueles pés. Afinal, o que mais me chamava atenção numa mulher, eu não podia ver, porque a diaba não se levantava.

_ Pfuh... Designer, é?

_ Éhhh... Eu estou fazendo um modelo que vai ficar lindo no seu pezinho...

Com uma carinha não muito convencida, ela esboçou um sorriso e eu perguntei seu nome.

_ Pra quê você quer saber o meu nome? Você está apaixonado pelos meus pés. Os nomes deles você já sabe.

_ Muito engraçado. Como eu vou conversar com a dona dos pés, se eu não sei o nome dela? Vai soar mal educado, não acha?

_ Já soou, querido. Você quase atacou o meu pé, né?

_ Você tem razão. Você tem toda razão. – Tive que pensar rápido. – Pensando bem, eu vou deixar você em paz. Talvez eu encontre outra modelo pra minha sandália nova... Desculpe, hein... Tchau... Estou indo...

Fui-me afastando, meio sem vontade. Depois de alguns passos, senti a mãozinha delicada dela no meu ombro esquerdo.

_ Ei, designer. Tá bom, eu te perdôo, pela péssima abordagem.

Ui, ela estava de pé. Agora podia ver sua bunda. Ao me virar, meus olhos foram atraídos pelos diabinhos brancos. As unhas curtas e bem feitas, davam aparência de umas frutinhas querendo ser lambidas...

_ Nossa, você gostou mesmo do meu pé.

_ E como se chama a dona deles? – Eu insisti, sorrindo.

_ Betânia. E você?

_ Sidney. Sidney Leão, a seu dispor.

Bem, depois disso, levei Betânia pro quiosque, onde conversamos sobre a possibilidade de ela ser modelo de pés. À noite, a levei pro barzinho. Dois dias depois, pro estúdio fotográfico de um parceiro. Não pergunte das fotos, meu amigo disse que ficaram péssimas. Mas, graças à minha lábia que, modéstia à parte, já era treinada para as bundas, em duas semanas Betânia já estava enfiando o pé na jaca, quer dizer, na minha boca e eu lambi e chupei aqueles dedinhos como se fossem carolinas recheadas com sorvete de baunilha. Muitas e muitas e muitas vezes... Sem nem ligar muito pra bundinha de Betânia.

Desde então, a bunda passou a ocupar um lugar secundário nas minhas preferências. Eu olho direto pros pés da moça depois, eu olho pra bunda, que agora já tem que ter algumas qualidades. Os pés, não. Se forem magros, ou cheinhos, com dedos longos ou curtos, rebeldes ou uniformes, angulosos ou redondinhos, tanto faz. Também não me importa a cor, lambo e me delicio com qualquer um. Mas se forem branquinhos como os de Betânia, ganham meu pau e meu coração. Betânia. Betânia dos pés mais lindos do mundo, com sabor de carolina recheada.

A merda foi quando ela pediu pra ver as fotos. Eu consegui enrolar um tempo, dizendo que só os produtores podiam ver, afinal eles é que iam escolher qual pezinho calçaria a tal sandália, que nunca existiu. Mas Betânia não era burra, pra meu azar. Betânia... Tão educada, que foi sumindo lentamente, sem sequer eu perceber. Quando eu achei que a tinha pego pelo pé, ela foi sumindo devagar, como o restinho da onda que vai escoando pela areia branca e volta pro fundo do mar.

5 comentários:

Vicente Portella disse...

Legal o texto....mas entre bunda e pés eu prefiro bunda...rsrsrs
Beijão

Beatriz Oliveira disse...

KKKKKKKKKKKKK
É a preferência universal, né? Mas tem uns caras tarados em pés, tb... rs Acho legal... KKKKKKKKKK

Vicente Portella disse...

Não despreso taras, meu anjo, mas bunda é bunda...rsrs
beijos

Carracena disse...

O texto é incrivelmente honesto! E
mais: corajoso!
Espero que as pessoas percebam a complexidade e a delicadeza.
Taras podem ser afetuosas. Que bom!

Unknown disse...

Incrivel!
É a cara de um amigo meu!rsrsr
Vou mandar p/ ele! Adorei!!!!