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Maricá - Itaipuaçu, Rio de Janeiro, Brazil
Sou poetisa, cantora, compositora e amante das artes.

domingo, 27 de novembro de 2011

DELÍRIOS DO STILNOX (Beatriz Oliveira)


Eu me sento no sofá vermelho e macio, pensando, já, em refestelar-me. Mas ainda não me é possível, pois tenho o prato de sopa nas mãos equilibrado. Vou sorvendo o creme espesso, com sabor de frango e pequenos filetes de salsa e fiapos de carne da ave. É bem saborosa e aquece o corpo. Sim. Eu estou com frio. Tenho os pés frios e as unhas das mãos levemente arroxeadas pela baixa temperatura, mas simplesmente não tenho coragem de largar o prato, levantar-me, seguir até o quaro, abrir três ou quatro gavetas até encontrar o pijama longo e meias, vestir-me, equilibrar a minha temperatura interna, por conta do tecido frio do pijama, voltar para o sofá, sentar, equilibrando o prato com sopa, colocar novamente o guardanapo ao alcance e recomeçar o ato de sorver.
Essa quebra na rotina simples seria uma bobagem, para alguns, entretanto, para mim significaria abdicar de um momento íntimo de relação comigo mesma, em que eu me equilibro e lido com o meu medo-desejo em relação ao alimento. Esse momento de identificação precisa ser clarificado na mente como um processo de autoconhecimento e libertação. Eu reconheço que sou prisioneira do calor da minha sopa. Mais do que do frio do tempo. Se fosse um sanduíche, eu levantaria. Um qualquer outro prato, eu levantaria. Exceto risoto de funghi. Tudo aclarado, pode-se dizer que, após a sopa quente, no meu sofá vermelho macio, o meu corpo foi-se largando, como se ali fosse ficar para sempre. E eu pude imaginar… Sem ética, educação, sociedade…
Ali eu ficaria. Esparramada no sofá, o prato no chão. Deu sono. Deitei e dormi. Deu calor. Despi-me. Deu tesão. Satisfiz-me. Deu sede. Abri a boca e veio a água. Deu fome. Abri a boca e a comida veio. Liguei a TV, deitada mesmo. Assisti O Clone, El Secreto De Tus Ojos, Inception, The Fountain. Chorei. Desejei justiça. Chorei. Desejei conhecimento. Chorei. Li As Intermitências da Morte, O Ensaio sobre a Cegueira, Clarice na Cabeceira. Gargalhei e chorei. Chorei. Chorei demais da conta! Desejei não pensar, dormi. Dormi muito mesmo! Três dias, seis dias, nove dias! Mas sonhei meu EU. Chorei. O que leva certas pessoas a serem ativas e outras extáticas? O que leva alguém mesmo extático a pensar, como se ativo fosse? A mente e o corpo se entorpecem, mas há uma parte de mim… Há uma parte que teima em emergir e, quanto mais empurrada para o fundo, mais ela impulsiona, no fundo, os pés com o intuito de elevar-se além da superfície.
Não há sonífero bastante! Ha ha ha! Não há entorpecente que segure o que eu sou! Na verdade, penso que o veneno me detona. Paralisa meu corpo e meu estado mental crítico, deixando-me a sós comigo mesma. Isso, embora seja extremamente perigoso, é também, por demais excitante. Pequeníssimas ondas, quase imperceptíveis de choque levíssimo, vão percorrendo minha nuca, minha lombar e meu púbis, como se houvesse pequenas borboletas agitando com velocidade inimaginável as suas finíssimas asas nessas partes do meu corpo.
Penso em tocar-me e sentir aumentadas as ondas, mas os meus olhos estão pesados.
O sonífero é bastante!
O sonífero é bastante.
O sonífero…

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