Tenho pensado acerca dos meus excessos, meus líquidos...
E acabei chegando à conclusão de que o meu corpo não tem absorvido bem as lágrimas que tenho me negado a derramar, por uma “força” que teimei construir com o que chamam de maturidade.
Sempre evito reclamar das minhas mazelas e estou ininterruptamente sorrindo, apesar dos problemas que a vida me apresenta, o que faz os outros pensarem que eu sou uma pessoa altamente positiva e feliz.
Não me considero infeliz, que isso fique bem claro! Mas sou uma pessoa comum, com momentos de alegria e dor. Entretanto, que não se dá o direito de estragar o dia das pessoas ao seu redor com mau humor.
Há pouco tempo, pois, encontrei-me numa situação tragicômica: só, em meu apartamento, na madrugada, deitada em minha cama, com uma baita solidão, uma puta vontade de chorar e... Segurando o choro.
Pasmada, percebi o quanto essa coisa de positivismo me deixou doente! Eu tenho, durante muito tempo, me tirado o direito de me sentir triste porque a gente deve se sentir alegre sempre, dizem.
Há tempos, tenho dificuldade de derramar lágrimas. Preciso lançar mão de filmes tristes para alcançar o meu intento, quando muito necessito.
Passei, então, a elucubrar acerca da minha turva visão.
Meu cérebro tem produzido mais líquido do que o normal e a minha medula já não suporta mais a quantidade, não tem para onde enviá-lo e ele tem ido para os meus olhos. A minha visão está cada vez mais comprometida, mais embaçada, e eu sinto, amiúde, como se enxergasse através de um vidro úmido.
Frequentemente, é necessário abrir e fechar os olhos repetidas vezes, como que para espalhar as gotículas, para que seja possível enxergar um pouquinho melhor, mas a melhora não dura mais que algumas frações de segundo.
Lembro-me que, aos onze anos, quando ganhei minha primeira bicicleta tive vontade de gritar de alegria, mas não gritei, só agradeci, com educação. A educação que meus pais me ensinaram. E que na semana passada, quando bati o dedo do pé na mesa do trabalho, tirando um pedacinho dele, tive vontade de xingar e chorar, mas não fiz isso. Coloquei a mão na boca, fiquei vermelha e disse, com calma, que bati o dedo, enquanto ele sangrava.
Essa coisa me acompanha desde há muito tempo! Não sei quanto...
Acho que preciso voltar a ser criança... Mas não sei que criança. Não lembro quando fui uma criança capaz de gritar e chorar minhas dores e penso que elas foram-se acumulando no meu cérebro em forma de emoções líquidas que agora não têm mais para onde escoar.
E agora? Onde encontrar a idade ideal? Onde encontrar as lágrimas que teimam em não brotar? Aquelas que uma vez escravizadas não aprendem a se libertar. Aquelas de quem Saramago diz:
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